Associação Brasileira de Antropologia-ABA
Breve diagnóstico sobre a situação da antropologia
A antropologia constitui um campo consolidado e dinâmico no Brasil. No últimos anos, além de sua força tradicional, ela tem caminhado no sentido de ampliar sua relevância internacional, desempenhar um papel de maior importância na formulação de políticas e propostas para a sociedade e renovar seu próprio campo de pesquisa. Isso tudo, somado ao reconhecimento nacional e internacional pelos seus patamares de excelência, é resultado de uma relação indissociável entre programas de pós-graduação, ensino e pesquisa. Especialmente na última década houve uma crescente expansão dos programas de pós-graduação, tanto no que se refere à formação de recursos humanos quanto à produção científica. Assiste-se a uma inédita criação de cursos de graduação em antropologia em resposta a uma maior demanda por parte de órgãos governamentais, ONGs, institutos de pesquisa, sindicatos, instituições privadas de ensino superior, departamentos e institutos vários, por profissionais formados em antropologia. O número de programas de mestrado e de doutorado praticamente dobrou. Em 2001, havia dez programas de mestrado e seis programas de doutorado em antropologia concentrados em sua maioria no centro sul do país. Hoje são 18 programas de mestrado e 12 de doutorado. Com a expansão, aumentou o número de programas no Nordeste. Os programas de mestrado e doutorado passaram de um curso de mestrado e um doutorado para cinco cursos de mestrado e dois de doutorado. Também na Amazônia Legal, onde o único mestrado em antropologia havia encerrado suas atividades em 2005, foram criados recentemente dois programas de mestrado e de doutorado, respectivamente em Manaus e Belém, um destes resultando de indução da CAPES. Com base na inter-relação entre pesquisa e docência, antropólogos das várias instituições do país estão realizando pesquisas de ponta na intersecção de várias áreas de conhecimento que são de grande valor para a ciência, tecnologia e inovação. Entre estas estão os trabalhos em antropologia visual - que faz interseção com cinema, fotografia, iconografia, artes em geral, tecnologias da comunicação etc. – e a ampla experiência de pesquisa na Amazônia Legal, tanto no cerrado quanto no pantanal, em que antropólogos têm focalizado a relação entre populações, agrobiodiversidade e conhecimento tradicional, desenvolvimento e padrões de agricultura sustentável, conflitos ambientais, entre outros. Ressalta-se também o papel-chave da pesquisa antropológica na interface com as políticas públicas para grupos “minoritários”, característico do atual momento político nacional e global, bem como a eficaz atuação da antropologia brasileira em prol de uma educação para uma sociedade multi ou intercultural e, portanto, na promoção do reconhecimento e apreciação da diferenças entre povos e etnias. A manutenção e crescimento de uma comunidade antropológica de alto nível são pontos estratégicos para o bom desempenho em cenários republicanos conflitivos nos quais os antropólogos são chamados a atuar. O reconhecimento da seriedade e da qualidade da antropologia brasileira nessa frente exprime-se, por exemplo, na existência de um duradouro e ativo convênio entre a Associação Brasileira de Antropologia e o Ministério Público da União. Além disso, são igualmente importantes as presenças de duas associações científicas, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA, fundada em 1955) e a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS, em 1977), com seus congressos e liderança institucional. A ABA, em particular, tem atuado no contexto internacional em prol da formação do World Council of Anthropological Associations; e o lançamento, pela mesma associação, de uma revista on line, a Vibrant – Virtual Brazilian Anthropology -, com textos de antropólogos do Brasil em inglês, francês e espanhol, contribui decisivamente para um movimento de internacionalização.
Historicamente, a antropologia brasileira se caracteriza por um preponderante interesse por problemáticas relacionadas à etnologia indígena, às populações afro-brasileiras, às questões do campo e das cidades do Brasil, bem como aos diversos aspectos da cultura nacional. Entretanto, na década de 1980, começou um processo paralelo de internacionalização da pesquisa de campo resultante do interesse de alguns pesquisadores em fazer pesquisa fora do Brasil, da crescente atração de alunos de outros países (em especial, mas não somente, da América Latina), assim como do interesse cada vez maior por estudos comparativos no âmbito de convênios e intercâmbios bilaterais. Dessa forma, passa-se a gerar pesquisas não apenas na América Latina, mas na África e em países como o Timor Leste e China. Assim, a antropologia brasileira, que sempre teve fortes relações com a antropologia francesa, inglesa e norte-americana, ocupa hoje inegável liderança na América Latina e proeminência em suas relações com a antropologia portuguesa e com os países africanos de expressão portuguesa. Frise-se, finalmente, que várias instituições e pesquisadores da área de antropologia associaram-se a instituições e pesquisadores de outras áreas e lideram um INCT, o Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos, um dos dois existentes na área estratégica de Segurança Pública, do Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, integrando-se à política pública de ciência e tecnologia voltada para a formação de redes de pesquisadores e instituições, para a produção de conhecimento e de quadros capazes de reproduzi-lo, além de promover sua difusão na sociedade mais ampla. Desafios - Os novos cursos de graduação e sua avaliação Até recentemente, não havia nenhum curso de antropologia ao nível de graduação, dando-se a formação somente ao nível da pós-graduação. A metade dos egressos de programas de pós-graduação em antropologia provinha de cursos de graduação de ciências sociais e, os demais, de outras áreas (Trajano Filho e Ribeiro 2004). Entretanto, entre 2005 e 2010, tendo em vista o aumento da demanda por antropólogos no mercado – por parte de ONGs, institutos de pesquisa, agências governamentais, sindicatos e outros – e a necessidade de proporcionar melhor qualificação profissional, sete cursos de graduação em antropologia foram criados, no âmbito do Reuni, cinco dos quais já em funcionamento. A criação de cursos de graduação em antropologia tem sido foco das discussões e debates realizados no âmbito da ABA desde início da década de 1990. Levando em conta as exigências de diminuição do tempo de titulação do mestrado e ao mesmo tempo os desafios do ensino decorrentes das novas exigências profissionais da carreira (ainda não regulamentada), tornou-se necessário realizar uma reavaliação da antropologia na graduação e de seu lugar tradicional no âmbito das ciências sociais em favor de uma perspectiva mais ampla e humanista centrada na tradição antropológica e nos desafios contemporâneos. (Tavares 2009). Com esse objetivo, ao invés da formação pontual em mestrados profissionais que enfatizam a eficiência técnica, os novos cursos de graduação recentemente implantados, embora com currículos diversos, se dispõem a dar aos alunos competência profissional em antropologia, inclusive ênfase em pesquisa de campo e disciplinas introdutórias à arqueologia e à lingüística antropológica, ou habilitações em antropologia social e arqueologia, por exemplo. Os currículos desses novos cursos, como de outros afins que tendem a considerar as interfaces da antropologia com outras áreas disciplinares (inclusive daquelas existentes com as ciências sociais), são uma resposta ao desafio de se dar a necessária formação em antropologia para atender à crescente demanda por antropólogos no mercado trabalho. Como são cursos novos, torna-se imperativo acompanhar, avaliar e refletir criticamente sobre o seu desenvolvimento. - Expansão da pós-graduação em antropologia, dispersão e superação de papel subalterno
Os novos cursos resultaram, via-de-regra, de desmembramentos de programas de ciências sociais ou sociologia que geralmente contam com a participação de antropólogos em seu corpo docente. Dado esse vínculo histórico, em algumas instituições os antropólogos, além de atuarem em seus programas disciplinares, independentemente da expansão de programas de antropologia, continuam a atuar em programas de diferentes áreas de conhecimento, predominantemente em cursos de ciências sociais ou sociologia, cujos números também têm aumentado. Assim, boa parte da pesquisa antropológica, em especial na Amazônia e no Nordeste, ainda é realizada em cursos de ciências sociais - e particularmente por antropólogos de outras áreas do país e do exterior - apontando, assim, para um outro desafio representado pela persistente dispersão da pesquisa. Esta também indica a posição subalterna de antropólogos (como também de lingüistas e arqueólogos) no sistema de pós-graduação dessas regiões e as dificuldades de consolidação de trabalhos amparados em pesquisas etnográficas e no trabalho de campo. - Prioridades de pesquisa e novos temas A produção do conhecimento antropológico é em grande parte baseada em trabalho de campo que implica em vivência prolongada dos pesquisadores com seus sujeitos de pesquisa. Da mesma forma, os diálogos intelectuais entre orientador e orientando, com base numa relação de certa forma artesanal, são cruciais para a formação do antropólogo (Trajano 2001). Se o trabalho de campo (que tende a ser individual) e a relação artesanal entre orientador e orientando constituem pontos fortes da produção do conhecimento antropológico e da formação disciplinar, ao mesmo tempo tendem a levar a certa fragmentação da produção em torno de um grande número de linhas e grupos de pesquisa. Assim, se em 1979, o CNPq registrava 215 linhas de pesquisa antropológica, em 2001, passaram a ser 475 e 142 grupos. O grande desafio será o de estimular a formação de redes que possam levar a elaboração de grandes projetos sem perder essa característica da pesquisa antropológica minuciosa e intensiva. Torna-se importante refletir sobre uma agenda com prioridades de pesquisa, em um contexto em que as temáticas e os sujeitos de pesquisa se multiplicam para uma disciplina cuja articulação com a sociedade vai além do usual atendimento das demandas de mercado, que em geral permeiam as relações universidade-sociedade. Na interface com a saúde, por exemplo, a análise antropológica torna-se relevante para entender as representações sobre doenças e processos terapêuticos como parte dos sistemas simbólicos culturalmente ordenados e os contextos sociais nos quais ocorrem, como também para examinar e analisar os aspectos organizacionais, institucionais e político-ideológicos dos programas de saúde pública. Estudos realizados na cidade, seja na intersecção com a sociologia ou com o direito, têm examinado problemáticas sobre, por exemplo, grupos urbanos, pobreza, movimentos sociais, violência, justiça, religião e políticas de administração de conflitos entre outras que podem igualmente subsidiar políticas públicas. Nesse âmbito, os estudos sobre gênero, família, gerações, sexualidade e reprodução recobrem focos muito importantes da atenção e preocupação pública. Embora seja uma área ainda incipiente, desenvolve-se, por outro lado, com grande vigor a antropologia da ciência e da técnica, acompanhando tendências internacionais. É um campo promissor de interação e diálogo interdisciplinar, favorecendo a reflexividade geral da experiência científica e tecnológica em nosso país, particularmente nessa delicada fronteira entre as ciências hard e soft. Esta perspectiva mais ampla da antropologia foi extensamente discutida pela comunidade antropológica em 2005, particularmente no âmbito da Área de Antropologia e Arqueologia da CAPES e da Associação Brasileira de Antropologia, por ocasião da elaboração de uma nova tabela de áreas de conhecimento solicitada pelo CNPq. Com base nessas discussões, foi sugerida a formação de duas subáreas, nomeadamente Antropologia Social/Cultural e Antropologias Especializadas (especificamente Antropologia Biológica, Antropologia Lingüística e Cultura Material) e 37 especialidades. Muito embora não tenha sido implementada, essa tabela indica, assim, o amplo escopo da antropologia que se faz atualmente no Brasil e suas interfaces com outras áreas disciplinares que vão além da tradicional e contínua relação com as ciências sociais. - Regionalização Os investimentos recentes feitos na expansão de cursos de graduação e pós estão sendo imprescindíveis para a formação de quadros e a consolidação de grupos de pesquisa na Amazônia Legal e o Nordeste. Entretanto, deve-se chamar a atenção para o fato de que, mesmo com esses investimentos, somente um terço do total dos cursos de pós-graduação em antropologia estão atualmente localizados nessas regiões. Além das grandes distâncias na região amazônica, que dificultam a comunicação, esses novos cursos, embora com bons corpos docentes, carecem de infra-estrutura, especialmente em recursos bibliotecários. Portanto, persistem os desafios de se dirimir essas desigualdades regionais que, no caso da Amazônia Legal são dramáticas, a despeito dos investimentos. É importante estimular uma atuação que seja descentralizada e que seja operacionalizada por meio da formação de redes inter-institucionais. As redes de pesquisa a partir do centro-sul não obtém, como resultado, a geração de profissionais qualificados nas regiões citadas. Levando-se em conta que existe um forte potencial para redes e cooperações entre instituições que atuam nos diferentes estados da Amazônia, torna-se imprescindível descentralizar e regionalizar a pesquisa e o ensino. Os convênios e parcerias, portanto, devem ser formados tanto com os pólos de pesquisa e ensino no centro-sul brasileiro quanto no interior da região. - A questão dos quatro campos Se a pós-graduação brasileira se caracterizou desde a sua implantação por uma formação em antropologia social está começando a surgir no Brasil (como também nos EUA) uma emergente re-apropriação do modelo dos “quatro campos” (arqueologia, antropologia social/cultural, antropologia biológica e antropologia lingüística), no quadro da globalização contemporânea. Esse modelo, que nos primórdios da antropologia foi utilizado para analisar a humanidade através de grandes esquemas evolucionistas e difusionistas, está sendo reelaborado e sobreposto às práticas de trabalho de campo microscópicas desenvolvidas a partir de estudos realizados em sociedades e culturas particulares para analisar um amplo leque de problemáticas contemporâneas, relacionadas à produção do conhecimento tradicional, ao patrimônio cultural e inclusão social, ao desenvolvimento econômico e social, entre outros, que levam às interfaces com outras áreas do conhecimento. Ao se valer das interfaces com diferentes áreas disciplinares (não só das outras ciências sociais como com o direito, saúde, biologia, lingüística, ecologia e educação, entre outras) e, portanto, de maior interdisciplinaridade, os antropólogos têm relacionado seu conhecimento in loco sobre culturas e práticas locais a processos macroscópicos, contribuindo sistematicamente com subsídios para a formulação de políticas públicas em várias áreas, bem como para retratar a dimensão humana, social e cultural da ciência, tecnologia e inovação. É preciso, para tanto, privilegiar a formação de redes e campos interdisciplinares como, por exemplo, antropologia indígena e direito, territorialização e estado, biodiversidade e antropologia ambiental, antropologias simétricas (etnobiologias e biologias; antropologias perspectivistas), patrimônio material e imaterial, antropologia e saúde e antropologia e educação. Recomendações I - Diretrizes Gerais Deve-se valorizar a riqueza e diversidade da produção antropológica, que é, inevitavelmente, inter, multi e transdisciplinar. Por não ser uma disciplina fechada, a antropologia traz perspectivas e pontos de vista, que se caracterizam por modos de investigação e tradições de trabalho que permitem não apenas a existência de um conjunto atuante de pesquisadores que compartilham experiências e projetos característicos, mas um modo de olhar o mundo e a sociedade, com potencial não só de desenvolvimento científico no sentido restrito, mas de ação social no sentido mais amplo. As diversas perspectivas abertas pela antropologia são importantes para expor a dimensão humana da ciência, tecnologia e inovação:
1. realizar, sob a coordenação da ABA, planejamento estratégico da área com o objetivo de estabelecer uma agenda de prioridades de pesquisa baseada em estado da arte da antropologia pós-Reuni relacionada à CT&I; 2. realizar, sob a coordenação da ABA, um estado da arte das relações interdisciplinares da antropologia – como as existentes entre antropologia e saúde, antropologia e direito, antropologia e patrimônio cultural, antropologia e estudo das cidades, antropologia e desenvolvimento, antropologia e educação etc. - que possa resultar na operacionalização de projetos multidisciplinares de relevância para a CT&I; 3. promover a articulação de redes de pesquisa nessas diversas áreas interdisciplinares da antropologia que possam eventualmente ser revertidas em grandes projetos de pesquisa; 4. nesse contexto, estabelecer grandes campos de atuação da antropologia. Por exemplo: antropologia e direito; globalização; geopolíticas internacionais; questão étnica; questão interétnica; políticas da identidade e da diferença; antropologias e políticas públicas. 5. estimular a reflexão sobre o papel da antropologia em um Brasil global player, no contexto de emergência de novas lideranças e potencias mundiais; 6. definir o papel e atuação dos antropólogos numa sociedade multi, inter e pluricultural, assim como seu papel no reconhecimento e apreciação da diferença, particularmente no tocante à elaboração de políticas públicas voltadas para segmentos sociais urbanos e rurais em situações de desvantagem e risco social, sociedades indígenas, quilombolas e outros grupos étnicos diferenciados. II - Nas políticas de incentivo a CT&I para Norte, Nordeste e Centro Oeste. 1. respeitar as especificidades históricas das regiões, criando modelos próprios a elas, estimulando, promovendo e possibilitando a cooperação científica e tecnológica com programas e grupos de C&T consolidados no país; 2. descentralizar e regionalizar a pesquisa e o ensino. Convênios e parcerias devem ser formados tanto com os pólos de pesquisa e ensino do centro-sul do Brasil quanto no interior da região. 3. realizar investimentos em C&T para promover inovação com base nos recursos existentes, a fim de articular e potencializar recursos para suprir as imensas carências regionais; 4. investir na formação de Programas de Pós-Graduação, a partir da criação e consolidação de estruturas de pesquisa, extensão e intervenção, potencializando os recursos existentes nos cursos de graduação e pós-graduação e incentivando a iniciação científica; 5. valorizar e registrar de modo equânime iniciativas intra-regionais que possam facilitar e promover a circulação de recursos humanos e materiais em C&T; 6. promover e apoiar linha de investimentos na disponibilização, via internet, e divulgação de obras científicas de primeira linha (a serem sugeridas pela área), para atender às demandas por bibliotecas; 7. rever os processos de avaliação adaptando-os às formas de articulação em que o interinstitucional deve ser valorizado com peso igual a todas as instituições participantes; 8. intensificar o fomento de programas do tipo DINTER, MINTER e PROCAD como soluções emergenciais para acelerar a implantação e promover a melhora dos programas de pós-graduação, especialmente em regiões carentes como a Amazônia Legal;. 9. estimular a criação de programas de pesquisas associados a programas de pós-graduação, assim como aos novos cursos de graduação em antropologia, facilitando aos pesquisadores-doutores treinar alunos, particularmente através de iniciação científica; 10. dotar estes núcleos de infra-estrutura necessária para o desenvolvimento de suas atividades, incluindo estruturas físicas adequadas, valorizando os programas já existentes e dando continuidade às iniciativas testadas com resultados bastante positivos. III – Nas políticas de financiamento à pesquisa
1. adequar a dotação de os recursos das agências financiadoras e prioridades às necessidades de
promover o desenvolvimento em CT&I, considerando o peso relativo de cada área de conhecimento e evitando as distorções frequentes na distribuição de recursos e prioridades. 2. adequar os critérios de julgamento e de produtividade para que levem em conta peculiaridades e diferenças entre às áreas de conhecimento, sendo as avaliações sempre referidas a estas, mesmo nos contextos de interdisciplinaridade; 3. adequar o planejamento e distribuição de recursos para que tenham melhor aproveitamento no atendimento das demandas geradas pelos editais; 4. adequar o modelo distribuição de recursos e prestação de contas de modo a permitir sua gestão racional e maior eficiência na aplicação em projetos de dimensão nacional e internacional. IV – Na política de avaliação das agências governamentais 1. Do CNPq. 1.1. destinar sistematicamente parte dos recursos disponíveis para concessão de bolsas de produtividade para atualização dos bolsistas que se encontrem em posição defasada em termos de sua classificação, assim como para atender a pedidos de reconsideração de classificação ou de não concessão eventualmente acolhidos; 1.2. tornar a distribuição de processos para os comitê assessores mais eficiente através do uso de meios eletrônicos e com a antecedência necessária para que sejam conhecidos pelos membros dos CAs, assim como consultar os mesmos na indicação de pareceristas ad hoc. 1.3. avaliar a excelência dos pesquisadores pela qualidade de seu trabalho e desempenho em pesquisa, aplicando os critérios da área. Estes devem considerar a posição relativa dos pesquisadores em suas trajetórias profissionais, dado que define e determina encargos e obrigações nem sempre traduzíveis em publicações voluntárias e/ou pontuais, não só oriundas de pesquisa individual, mas também vinculadas às atividades de coordenação e liderança de pesquisadores seniores, as quais implicam organização e participação obrigatórias em publicações e eventos; 1.4. criar comitês interdisciplinares que julguem processos apresentados a editais deste tipo, de acordo com critérios comuns às diferentes áreas ; 2. Da CAPES 2.1. manter sistema concorrencial aberto entre os programas da CAPES, não devendo o sistema ser pensado e organizado sob o ponto de vista da “raridade” obrigatória da excelência, cujos patamares superiores tenham que ser limitados por números percentuais arbitrários em relação ao total de programas da área, mas de sua “escassez”, o que implica estar sempre disposto a incorporar e encorajar mais uma excelência dentre os concorrentes; 2.2. manter, criar e ampliar programas destinados exclusivamente a distribuir recursos que sirvam ao estímulo de pesquisadores recém contratados nas inúmeras universidades e cursos novos, muitos vinculados ao programa Reuni, para que possam encontrar condições favoráveis para sua fixação em lugares fora dos centros tradicionais de produção de conhecimento científico, entre as quais o financiamento de seus deslocamentos, com periodicidade regular, para congressos e seminários que permitam sua atualização e eventual incorporação a redes de pesquisadores consolidadas ou em consolidação, visando a otimização dos recursos já empregados e a ampliação do alcance das políticas públicas de ensino e pesquisa em andamento.Historicamente, a antropologia brasileira se caracteriza por um preponderante interesse por problemáticas relacionadas à etnologia indígena, às populações afro-brasileiras, às questões do campo e das cidades do Brasil, bem como aos diversos aspectos da cultura nacional. Entretanto, na década de 1980, começou um processo paralelo de internacionalização da pesquisa de campo resultante do interesse de alguns pesquisadores em fazer pesquisa fora do Brasil, da crescente atração de alunos de outros países (em especial, mas não somente, da América Latina), assim como do interesse cada vez maior por estudos comparativos no âmbito de convênios e intercâmbios bilaterais. Dessa forma, passa-se a gerar pesquisas não apenas na América Latina, mas na África e em países como o Timor Leste e China. Assim, a antropologia brasileira, que sempre teve fortes relações com a antropologia francesa, inglesa e norte-americana, ocupa hoje inegável liderança na América Latina e proeminência em suas relações com a antropologia portuguesa e com os países africanos de expressão portuguesa. Frise-se, finalmente, que várias instituições e pesquisadores da área de antropologia associaram-se a instituições e pesquisadores de outras áreas e lideram um INCT, o Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos, um dos dois existentes na área estratégica de Segurança Pública, do Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, integrando-se à política pública de ciência e tecnologia voltada para a formação de redes de pesquisadores e instituições, para a produção de conhecimento e de quadros capazes de reproduzi-lo, além de promover sua difusão na sociedade mais ampla. Desafios - Os novos cursos de graduação e sua avaliação Até recentemente, não havia nenhum curso de antropologia ao nível de graduação, dando-se a formação somente ao nível da pós-graduação. A metade dos egressos de programas de pós-graduação em antropologia provinha de cursos de graduação de ciências sociais e, os demais, de outras áreas (Trajano Filho e Ribeiro 2004). Entretanto, entre 2005 e 2010, tendo em vista o aumento da demanda por antropólogos no mercado – por parte de ONGs, institutos de pesquisa, agências governamentais, sindicatos e outros – e a necessidade de proporcionar melhor qualificação profissional, sete cursos de graduação em antropologia foram criados, no âmbito do Reuni, cinco dos quais já em funcionamento. A criação de cursos de graduação em antropologia tem sido foco das discussões e debates realizados no âmbito da ABA desde início da década de 1990. Levando em conta as exigências de diminuição do tempo de titulação do mestrado e ao mesmo tempo os desafios do ensino decorrentes das novas exigências profissionais da carreira (ainda não regulamentada), tornou-se necessário realizar uma reavaliação da antropologia na graduação e de seu lugar tradicional no âmbito das ciências sociais em favor de uma perspectiva mais ampla e humanista centrada na tradição antropológica e nos desafios contemporâneos. (Tavares 2009). Com esse objetivo, ao invés da formação pontual em mestrados profissionais que enfatizam a eficiência técnica, os novos cursos de graduação recentemente implantados, embora com currículos diversos, se dispõem a dar aos alunos competência profissional em antropologia, inclusive ênfase em pesquisa de campo e disciplinas introdutórias à arqueologia e à lingüística antropológica, ou habilitações em antropologia social e arqueologia, por exemplo. Os currículos desses novos cursos, como de outros afins que tendem a considerar as interfaces da antropologia com outras áreas disciplinares (inclusive daquelas existentes com as ciências sociais), são uma resposta ao desafio de se dar a necessária formação em antropologia para atender à crescente demanda por antropólogos no mercado trabalho. Como são cursos novos, torna-se imperativo acompanhar, avaliar e refletir criticamente sobre o seu desenvolvimento. - Expansão da pós-graduação em antropologia, dispersão e superação de papel subalterno
Os novos cursos resultaram, via-de-regra, de desmembramentos de programas de ciências sociais ou sociologia que geralmente contam com a participação de antropólogos em seu corpo docente. Dado esse vínculo histórico, em algumas instituições os antropólogos, além de atuarem em seus programas disciplinares, independentemente da expansão de programas de antropologia, continuam a atuar em programas de diferentes áreas de conhecimento, predominantemente em cursos de ciências sociais ou sociologia, cujos números também têm aumentado. Assim, boa parte da pesquisa antropológica, em especial na Amazônia e no Nordeste, ainda é realizada em cursos de ciências sociais - e particularmente por antropólogos de outras áreas do país e do exterior - apontando, assim, para um outro desafio representado pela persistente dispersão da pesquisa. Esta também indica a posição subalterna de antropólogos (como também de lingüistas e arqueólogos) no sistema de pós-graduação dessas regiões e as dificuldades de consolidação de trabalhos amparados em pesquisas etnográficas e no trabalho de campo. - Prioridades de pesquisa e novos temas A produção do conhecimento antropológico é em grande parte baseada em trabalho de campo que implica em vivência prolongada dos pesquisadores com seus sujeitos de pesquisa. Da mesma forma, os diálogos intelectuais entre orientador e orientando, com base numa relação de certa forma artesanal, são cruciais para a formação do antropólogo (Trajano 2001). Se o trabalho de campo (que tende a ser individual) e a relação artesanal entre orientador e orientando constituem pontos fortes da produção do conhecimento antropológico e da formação disciplinar, ao mesmo tempo tendem a levar a certa fragmentação da produção em torno de um grande número de linhas e grupos de pesquisa. Assim, se em 1979, o CNPq registrava 215 linhas de pesquisa antropológica, em 2001, passaram a ser 475 e 142 grupos. O grande desafio será o de estimular a formação de redes que possam levar a elaboração de grandes projetos sem perder essa característica da pesquisa antropológica minuciosa e intensiva. Torna-se importante refletir sobre uma agenda com prioridades de pesquisa, em um contexto em que as temáticas e os sujeitos de pesquisa se multiplicam para uma disciplina cuja articulação com a sociedade vai além do usual atendimento das demandas de mercado, que em geral permeiam as relações universidade-sociedade. Na interface com a saúde, por exemplo, a análise antropológica torna-se relevante para entender as representações sobre doenças e processos terapêuticos como parte dos sistemas simbólicos culturalmente ordenados e os contextos sociais nos quais ocorrem, como também para examinar e analisar os aspectos organizacionais, institucionais e político-ideológicos dos programas de saúde pública. Estudos realizados na cidade, seja na intersecção com a sociologia ou com o direito, têm examinado problemáticas sobre, por exemplo, grupos urbanos, pobreza, movimentos sociais, violência, justiça, religião e políticas de administração de conflitos entre outras que podem igualmente subsidiar políticas públicas. Nesse âmbito, os estudos sobre gênero, família, gerações, sexualidade e reprodução recobrem focos muito importantes da atenção e preocupação pública. Embora seja uma área ainda incipiente, desenvolve-se, por outro lado, com grande vigor a antropologia da ciência e da técnica, acompanhando tendências internacionais. É um campo promissor de interação e diálogo interdisciplinar, favorecendo a reflexividade geral da experiência científica e tecnológica em nosso país, particularmente nessa delicada fronteira entre as ciências hard e soft. Esta perspectiva mais ampla da antropologia foi extensamente discutida pela comunidade antropológica em 2005, particularmente no âmbito da Área de Antropologia e Arqueologia da CAPES e da Associação Brasileira de Antropologia, por ocasião da elaboração de uma nova tabela de áreas de conhecimento solicitada pelo CNPq. Com base nessas discussões, foi sugerida a formação de duas subáreas, nomeadamente Antropologia Social/Cultural e Antropologias Especializadas (especificamente Antropologia Biológica, Antropologia Lingüística e Cultura Material) e 37 especialidades. Muito embora não tenha sido implementada, essa tabela indica, assim, o amplo escopo da antropologia que se faz atualmente no Brasil e suas interfaces com outras áreas disciplinares que vão além da tradicional e contínua relação com as ciências sociais. - Regionalização Os investimentos recentes feitos na expansão de cursos de graduação e pós estão sendo imprescindíveis para a formação de quadros e a consolidação de grupos de pesquisa na Amazônia Legal e o Nordeste. Entretanto, deve-se chamar a atenção para o fato de que, mesmo com esses investimentos, somente um terço do total dos cursos de pós-graduação em antropologia estão atualmente localizados nessas regiões. Além das grandes distâncias na região amazônica, que dificultam a comunicação, esses novos cursos, embora com bons corpos docentes, carecem de infra-estrutura, especialmente em recursos bibliotecários. Portanto, persistem os desafios de se dirimir essas desigualdades regionais que, no caso da Amazônia Legal são dramáticas, a despeito dos investimentos. É importante estimular uma atuação que seja descentralizada e que seja operacionalizada por meio da formação de redes inter-institucionais. As redes de pesquisa a partir do centro-sul não obtém, como resultado, a geração de profissionais qualificados nas regiões citadas. Levando-se em conta que existe um forte potencial para redes e cooperações entre instituições que atuam nos diferentes estados da Amazônia, torna-se imprescindível descentralizar e regionalizar a pesquisa e o ensino. Os convênios e parcerias, portanto, devem ser formados tanto com os pólos de pesquisa e ensino no centro-sul brasileiro quanto no interior da região. - A questão dos quatro campos Se a pós-graduação brasileira se caracterizou desde a sua implantação por uma formação em antropologia social está começando a surgir no Brasil (como também nos EUA) uma emergente re-apropriação do modelo dos “quatro campos” (arqueologia, antropologia social/cultural, antropologia biológica e antropologia lingüística), no quadro da globalização contemporânea. Esse modelo, que nos primórdios da antropologia foi utilizado para analisar a humanidade através de grandes esquemas evolucionistas e difusionistas, está sendo reelaborado e sobreposto às práticas de trabalho de campo microscópicas desenvolvidas a partir de estudos realizados em sociedades e culturas particulares para analisar um amplo leque de problemáticas contemporâneas, relacionadas à produção do conhecimento tradicional, ao patrimônio cultural e inclusão social, ao desenvolvimento econômico e social, entre outros, que levam às interfaces com outras áreas do conhecimento. Ao se valer das interfaces com diferentes áreas disciplinares (não só das outras ciências sociais como com o direito, saúde, biologia, lingüística, ecologia e educação, entre outras) e, portanto, de maior interdisciplinaridade, os antropólogos têm relacionado seu conhecimento in loco sobre culturas e práticas locais a processos macroscópicos, contribuindo sistematicamente com subsídios para a formulação de políticas públicas em várias áreas, bem como para retratar a dimensão humana, social e cultural da ciência, tecnologia e inovação. É preciso, para tanto, privilegiar a formação de redes e campos interdisciplinares como, por exemplo, antropologia indígena e direito, territorialização e estado, biodiversidade e antropologia ambiental, antropologias simétricas (etnobiologias e biologias; antropologias perspectivistas), patrimônio material e imaterial, antropologia e saúde e antropologia e educação. Recomendações I - Diretrizes Gerais Deve-se valorizar a riqueza e diversidade da produção antropológica, que é, inevitavelmente, inter, multi e transdisciplinar. Por não ser uma disciplina fechada, a antropologia traz perspectivas e pontos de vista, que se caracterizam por modos de investigação e tradições de trabalho que permitem não apenas a existência de um conjunto atuante de pesquisadores que compartilham experiências e projetos característicos, mas um modo de olhar o mundo e a sociedade, com potencial não só de desenvolvimento científico no sentido restrito, mas de ação social no sentido mais amplo. As diversas perspectivas abertas pela antropologia são importantes para expor a dimensão humana da ciência, tecnologia e inovação:
1. realizar, sob a coordenação da ABA, planejamento estratégico da área com o objetivo de estabelecer uma agenda de prioridades de pesquisa baseada em estado da arte da antropologia pós-Reuni relacionada à CT&I; 2. realizar, sob a coordenação da ABA, um estado da arte das relações interdisciplinares da antropologia – como as existentes entre antropologia e saúde, antropologia e direito, antropologia e patrimônio cultural, antropologia e estudo das cidades, antropologia e desenvolvimento, antropologia e educação etc. - que possa resultar na operacionalização de projetos multidisciplinares de relevância para a CT&I; 3. promover a articulação de redes de pesquisa nessas diversas áreas interdisciplinares da antropologia que possam eventualmente ser revertidas em grandes projetos de pesquisa; 4. nesse contexto, estabelecer grandes campos de atuação da antropologia. Por exemplo: antropologia e direito; globalização; geopolíticas internacionais; questão étnica; questão interétnica; políticas da identidade e da diferença; antropologias e políticas públicas. 5. estimular a reflexão sobre o papel da antropologia em um Brasil global player, no contexto de emergência de novas lideranças e potencias mundiais; 6. definir o papel e atuação dos antropólogos numa sociedade multi, inter e pluricultural, assim como seu papel no reconhecimento e apreciação da diferença, particularmente no tocante à elaboração de políticas públicas voltadas para segmentos sociais urbanos e rurais em situações de desvantagem e risco social, sociedades indígenas, quilombolas e outros grupos étnicos diferenciados. II - Nas políticas de incentivo a CT&I para Norte, Nordeste e Centro Oeste. 1. respeitar as especificidades históricas das regiões, criando modelos próprios a elas, estimulando, promovendo e possibilitando a cooperação científica e tecnológica com programas e grupos de C&T consolidados no país; 2. descentralizar e regionalizar a pesquisa e o ensino. Convênios e parcerias devem ser formados tanto com os pólos de pesquisa e ensino do centro-sul do Brasil quanto no interior da região. 3. realizar investimentos em C&T para promover inovação com base nos recursos existentes, a fim de articular e potencializar recursos para suprir as imensas carências regionais; 4. investir na formação de Programas de Pós-Graduação, a partir da criação e consolidação de estruturas de pesquisa, extensão e intervenção, potencializando os recursos existentes nos cursos de graduação e pós-graduação e incentivando a iniciação científica; 5. valorizar e registrar de modo equânime iniciativas intra-regionais que possam facilitar e promover a circulação de recursos humanos e materiais em C&T; 6. promover e apoiar linha de investimentos na disponibilização, via internet, e divulgação de obras científicas de primeira linha (a serem sugeridas pela área), para atender às demandas por bibliotecas; 7. rever os processos de avaliação adaptando-os às formas de articulação em que o interinstitucional deve ser valorizado com peso igual a todas as instituições participantes; 8. intensificar o fomento de programas do tipo DINTER, MINTER e PROCAD como soluções emergenciais para acelerar a implantação e promover a melhora dos programas de pós-graduação, especialmente em regiões carentes como a Amazônia Legal;. 9. estimular a criação de programas de pesquisas associados a programas de pós-graduação, assim como aos novos cursos de graduação em antropologia, facilitando aos pesquisadores-doutores treinar alunos, particularmente através de iniciação científica; 10. dotar estes núcleos de infra-estrutura necessária para o desenvolvimento de suas atividades, incluindo estruturas físicas adequadas, valorizando os programas já existentes e dando continuidade às iniciativas testadas com resultados bastante positivos. III – Nas políticas de financiamento à pesquisa
1. adequar a dotação de os recursos das agências financiadoras e prioridades às necessidades de
Brasilia, 25 de maio de 2010
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